terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Tizuka Yamasaki


Filha e neta de japoneses, Tizuka Yamasaki nasceu numa fazenda de café no Rio Grande do Sul, mas foi criada em Atibaia, no interior de São Paulo. Aos 15 anos foi estudar na capital e em 1970 transferiu-se para Brasília.
Cursava arquitetura na Universidade de Brasília, quando a faculdade foi fechada. Ela se transferiu para a Universidade Federal Fluminense e decidiu fazer cinema.
Nesse período, fez alguns curta-metragens e conheceu Nelson Pereira dos Santos, seu professor, com quem desenvolveu a revista "Luz e Ação", que acabou não saindo. Porém, as idéias do cineasta a influenciaram e ela começou a fazer o trabalho de continuista e fotógrafa de cena em "O Amuleto de Ogum", em 1974.
A partir daí, Tizuka trabalhou com grandes nomes da indústria cinematográfica nacional como o próprio Nelson Pereira dos Santos, Glauber Rocha, Lael Rodrigues, Paulo Thiago e outros.
Em 1978 ela abriu sua própria produtora, a CPC, que produziu filmes consagrados como "Bar Esperança", "Rio Babilônia" e "Idade da Terra", de Glauber Rocha. Em 1980 ela desenvolveu o roteiro de "Gaijin- Caminhos da Liberdade", seu primeiro longa-metragem como diretora, que conta a história de uma família de japoneses que veio para o Brasil trabalhar na lavoura e passou por todas as dificuldades que passaram os imigrantes no país do começo do século.
O filme conquistou vários prêmios, inclusive o de melhor filme no Festival de Gramado e uma menção especial do júri no Festival de Cannes.
"Pátriamada" (1988) aborda o processo das "Diretas Já!" nos anos 80. O filme começou a ser rodado sem ter o roteiro pronto, durante os comícios reais pelas eleições diretas. Desse modo, tem caráter de documentário e um inevitável envolvimento emocional com o tema.
Tizuka também fez "Lua de Cristal" (1990), com Xuxa Meneghel e Sérgio Malandro e um filme dos Trapalhões, também para o público infantil, além de "Parahyba, Mulher Macho" (1983) e "Fica Comigo" (1996). Fez ainda trabalhos para televisão, música e teatro. Dirigiu novelas ("Kananga do Japão", "O pagador de Promessas"), óperas ("Madame Butterfly"), videoclips ("Jimmy Cliff") e comerciais, além de se dedicar a projetos pessoais como oficinas de direção e de vídeo ou aulas e palestras em Universidades.

Filmes

2005 - Gaijn - Ama-me Como Sou (Gaijin 2)
2000 - Popstar (Popstar)
1999 - Xuxa Requebra
1997 - O Noviço Rebelde (O Noviço Rebelde)
1996 - Fica comigo
1990 - Lua de Cristal (Lua de Cristal)
1984 - Patriamada
1983 - macho
1980 - Gaijin - Caminhos da Liberdade (Gaijin)

Curiosidades:

- A atriz Kyoko Tsukamoto fez parte do elenco de Gaijin - Caminhos da Liberdade, interpretando a mesma personagem de Gaijin - Ama-me Como Sou.
- A atriz Nobu McCarthy faleceu em meio às filmagens de Gaijin - Ama-me Como Sou, vítima de aneurisma abdominal.
- Quando a produção do filme chegou a londrina Aya Ono se candidatou a ser uma das figurantes. Os produtores gostaram tanto dela que a contrataram para protagonizar a história.
- Foram usados cerca de 3 mil figurantes durante as filmagens.
- As seguintes cidades serviram de locação para o filme: Londrina, Maringá, Curitiba, Foz do Iguaçu, Paranaguá, Cambará, Piuím, Formiga, Palmas, Rio Javaés e Kobe, no Japão.
- Precedido por Gaijin - Caminhos da Liberdade (1981).
- O orçamento de Gaijin - Ama-me Como Sou foi de R$ 10.632.890,32.

Prêmios

- Ganhou o Prêmio FIPRESCI no Festival de Cannes, por "Gaijin - Caminhos da Liberdade" (1980).
- Ganhou 2 vezes o Kikito de Ouro de Melhor Filme no Festival de Gramado, por "Gaijin - Caminhos da Liberdade" (1980) e "Gaijin - Ama-me Como Sou" (2005).
- Ganhou o Kikito de Ouro de Melhor Diretor no Festival de Gramado, por "Gaijin - Ama-me Como Sou" (2005).
- Ganhou o Kikito de Ouro de Melhor Roteiro no Festival de Gramado, por "Gaijin - Caminhos da Liberdade" (1980).
- Ganhou o Prêmio do Público no Festival de Brasília, por "Parahyba, Mulher-Macho" (1983).
- Ganhou o Prêmio Grand Coral no Festival de Havana, por "Gaijin - Caminhos da Liberdade" (1980).
- Ganhou a Margarida de Prata, por "Gaijin - Caminhos da Liberdade" (1980).

Entrevista

Canal: SESC TV
Programa: Sala de Cinema
Junho 2008

“Foi fazendo cinema que resgatei meus antepassados”

Nesta entrevista, realizada por email durante as filmagens de seu novo longa, Tizuka fala sobre sua identidade cultural e novos projetos. Mais do que isso, mostra um momento da saga dos imigrantes japoneses no Brasil e das novas gerações que aqui cresceram.

Como você, neta de imigrantes japoneses, vê e entende a história da imigração para o Brasil?

Se tivesse que resumir em poucas linhas a trajetória dos imigrantes japoneses no Brasil, diria que foi um processo de adaptação muito difícil. Primeiro porque Japão e Brasil têm povos culturalmente muito diferentes, e segundo porque os imigrantes sofreram muito devido ao fato de acreditarem em falsas promessas divulgadas pelas companhias de imigração japonesas. Adolescente, minha avó materna Titoe Koga queria ajudar seus pais, que viviam uma situação muito difícil lá, como grande parte dos japoneses. Neste espírito aventureiro, ela embarcou com os tios rumo ao Brasil para tomar conta dos seus primos menores. Ela tinha apenas 14 anos quando veio para cá no navio Hakata Maru com a família do seu tio Kuriki. Eram todos da província de Fukuoka, sul do Japão. Chegando aqui, ela imediatamente pegou a enxada e foi cuidar do cafezal, como uma adulta. Sua intenção era poupar o máximo que pudesse e voltar para o Japão. Acreditava que em cinco anos ganharia muito dinheiro para levar aos seus pais que passavam uma crise financeira grave. Esse era o pensamento de todas as famílias dos imigrantes. Como ficou provado, a vida miserável dos primeiros anos impediu que ela cumprisse a sua promessa. Os anos passaram, ela se casou, teve dois filhos, dos quais um morreu, e ficou viúva. Nos anos de 1920, uma mulher sozinha, viúva e com uma filhinha, não tinha alternativas para uma vida independente. Por isso casou-se pela segunda vez. Meu segundo avô, Shimekiti Nishi, já era um bem sucedido motorista de táxi em São Paulo. Os dois arrendaram uma pequena chácara em Mairiporã e aí começaram a sua vida independente. Minha avó plantava e meu avô vendia na cidade, durante a Segunda Guerra. Pelo fato do meu avô ter uma caminhonete e saber dirigir, a família teve vantagens. Logo puderam comprar uma fazenda em Atibaia e plantar batatas. Posteriormente, se dedicaram a frutas e flores. Minha avó foi pioneira no morango e nas rosas no município de Atibaia, hoje considerado justamente a terra dos morangos e das flores. No fim das contas, minha avó só pôde voltar ao Japão para rever seus familiares 40 anos depois de ter imigrado para o Brasil. Aqui, de tostão a tostão, como minha avó dizia, eles juntaram um pequeno patrimônio capaz de ter dado à filha deles, minha mãe Sumiko, uma propriedade na cidade para que ela tivesse uma escola de costura. Essa profissão era bastante importante numa época em que as roupas ainda não eram tão industrializadas. Meu pai, que também era imigrante, morreu cedo. Foi com a escola e com as economias dos meus avós que eu e minha irmã, Yurika, pudemos chegar à universidade.

Seus filmes Gaijin - Ama-me como sou (2005) e Gaijin - Os caminhos da liberdade (1980) abordam, respectivamente, a mudança do Japão para o Brasil e o caminho contrário. O que esses filmes representam?

O motivo para pensar na produção do primeiro “Gaijin” foi a vontade de entender quem eu era, sendo tão diferente dos brasileiros em geral. Fui resgatar a história de minha família para que eu me compreendesse neste contexto brasileiro. E também para que meus pares me entendessem. A inspiração para produção do “Gaijin 2”, após vinte anos do primeiro filme, foi minha avó e suas histórias. Com estes dois filmes, quis expressar toda essa vivência. Quis mostrar também que sou grata aos meus avós e ao meu pai por terem imigrado para o Brasil. Além de terem sido referência de coragem, trabalho, tenacidade, respeito e audácia, me deram a oportunidade de nascer aqui. Isso tem grande importância, porque o Brasil é um país novo, sem compromissos culturais e, portanto, sem preconceitos milenares tão arraigados. Somos um povo que é o melhor exemplo de convivência pacifica entre diferentes culturas e religiões. Fiz esses filmes para que o restante do Brasil e do mundo conhecessem um pouco da cultura nikei brasileira. São o conhecimento e o respeito pela diferença cultural que derrubam os muros do preconceito. Só tem preconceito quem é ignorante. Creio que o que marcou estes filmes foi o fato do tema estar intimamente ligado à minha vida, na medida que eu fazia parte de um assunto que neguei durante muito tempo e só depois de mais velha recuperei, com a realização dos filmes.

Você já dirigiu novelas e minisséries e também produções cinematográficas do mainstream. Qual a diferença entre esses trabalhos e outros realizados ao lado de renomados cineastas e suas produções autorais?

Dirigir e produzir programas de televisão, bem como realizar filmes ao lado de figuras como a Xuxa, me permitiu ver que meu trabalho poderia crescer muito com novas referências. A televisão me abriu outras portas profissionais e me fez perceber que ser diretora poderia ser mais gratificante se eu ampliasse os horizontes além do cinema. E isso aconteceu não só em termos profissionais, mas pessoal também. Foi muito bom ter convivido com a Xuxa na realização dos filmes com ela, Trapalhões e Sérgio Malandro, por exemplo. Compreendi melhor os meus filhos, que eram pequenos na época e completamente fãs dela e desses personagens. Acho, então, que esses trabalhos estão todos interligados, pessoal e profissionalmente.

O que o público pode esperar do seu próximo filme?

O filme, que já está sendo produzido, é uma adaptação do livro "O Mundo Místico dos Caruanas", da pajé Zeneida Lima, da Ilha do Marajó, no Pará. Conta a trajetória dessa mulher encantada, que desde pequena evocava energias naturais, chamadas por ela de Caruanas. Quando fui para a Amazônia pela primeira vez, me dei conta da minha pequeníssima dimensão como ser humano diante daquela exuberância toda. A única imagem que eu tinha do rio Amazonas vinha da televisão. Então, percebi que Amazônia que povoa nossas mentes não é a verdadeira. Ela é muito maior, mais desafiadora. E essa Amazônia que ninguém conhece pode acabar. Por isso resolvi fazer este filme: porque a perda não ocorre apenas com o desmatamento ou a biopirataria, mas com a degradação dos povos e da sua cultura. Talvez seja a primeira vez, de fato, que um filme de ficção brasileiro rodado no Pará tenha como foco primordial a valorização da cultura cabocla e do meio ambiente. Cada um de nós, com nossos respectivos meios e conhecimentos, pode defender a Amazônia. E o meu meio é o cinema.

Nenhum comentário:

Postar um comentário